O holocausto é o sacrifício supremo,
no marco de uma entrega total a causas sagradas e superiores, suprimiram-se os
sacrifícios e holocaustos dos cabritos e dos outros animais, em cujo lugar
agora se oferece do universal e redentor senhor Jesus Cristo: holocausto passa a significar sacrifício
dos Hebreus (Agamben, 2008). Para o deus Javé, divindade inspirada em Moloch, o
sacrifício dos primogênitos humanos
foi substituído pelo holocausto de
animais: “o deus é o pastor dos homens. [...] se Deus é o pastor dos homens, se
o rei também é o pastor dos homens” (Foucault, 2008: 167). Por volta de 2000 a
1500 anos antes de Cristo, segundo os sumerianos, o deus Moloch (ou Molek) somente
se acalmava quando era homenageado com o sacrifício ritual de criancinhas
inocentes, por exemplo: “por muito tempo, um dos privilégios característicos do
soberano fora o direito de vida e morte. Sem dúvida, ele derivava formalmente
da velha pátria potestas que concedia
ao pai de família romano o direito de ‘dispor’ da vida de seus filhos e de seus
escravos; podia retirar-lhes a vida, já que a tinha dado” (Foucault, 1988:127).
No infanticídio, ritual da antiguidade, as crianças eram executadas, na maioria
das vezes, por meio do apunhalamento ou do holocausto no fogo. O primeiro
registro encontrado da prática do infanticídio ritual data de 4000 a.C. na
região da antiga Suméria.
No ritual sumeriano, os recém-nascidos
eram sacrificados em reverência ao deus Anu. Em Israel, o frustrado sacrifício
de Isaac por Abraão e o efetivo holocausto da filha de Jefté demonstram como
estavam presentes nos primórdios da matriz religiosa cristãos infanticídios
ritualísticos (Mott, 1993). Além disso, sugere que, sendo primogênito em um regime paternalista, cabe, ao filho mais velho, a
maior parte da herança e a sucessão do posto ocupado pelo pai, não havendo razão
para revolta. Quanto à mãe há sua marginalidade na hierarquia patriarcal.
O Holocausto na tradição judaica
representou um ritual de sacrifício dos primogênitos, que recebem a maior parte
da herança dos pais num regime patriarcal. Jogar nas câmaras de gás os judeus
no holocausto não foi apenas uma matança generalizada, mas, segundo a tradição
judaica, os patrimônios seriam capturados pelo Estado Totalitário Nazista?
Afinal, o ritual de sacrifício de animais, que designa o holocausto, voltou a
ter o termo tradicional. Não resta dúvida que essa forma de ordenamento provém
do biopoder ou do campo biopolítico da soberania, colocando a loucura, a
esquizofrenia como limite do capitalismo. Sobre o racismo contra os doentes
mentais ao longo da Segunda Guerra, destaca-se a matança de loucos ordenada por
Hitler, mundo dos ‘mortos-vivos’, conforme Hannah Arendt: “a redução do homem a
um feixe de reações separa-o tão radicalmente de tudo que há nele de
personalidade e caráter quanto uma doença mental” (p.492). O Holocausto que
ocorreu nos campos de concentração nazistas martirizou o povo judeu e os
qualificou através do programa da eutanásia e da matança generalizada de
loucos.
Nos campos de concentração ocorria
todo tipo de humilhação, sofrimento e morte às vítimas, o que se chamava
‘truque de Himmler’: “em vez de dizer ‘Que coisas horríveis eu fiz com as pessoas!
’, os assassinos poderiam dizer ‘Que coisas horríveis eu tive de ver na
execução dos meus deveres, como essa tarefa pesa sobre meus ombros!’” (Zizek,
2008: 96). Para os carrascos nazistas suportarem os atos horrendos que
cometiam, diziam que não foram eles quem cometia os atos, mas que apenas viam
ou cumpriam apenas as ordens. Neste caso, descreve-se a importância do aguilhão
que brota exclusivamente do cumprimento das ordens nos homens. Sua defesa
contra novas ordens faz com que eles não tentem ouvi-las, acatá-las, não
atende. Se obrigado a entendê-las, esquiva-se delas: “tal reação é o que, na
psiquiatria, se denomina negativismo, algo que desempenha um papel
particularmente importante nos esquizofrênicos” (Canetti, 2005:323). Atenta-se,
do morto-vivo dos campos de concentração aos esquizofrênicos dos hospitais
psiquiátricos, passando pelo zombified, para quem as ordens que recebem,
através do monitoramento remoto neural (RNM), para matar, mas remotamente para
o controle do cérebro, a fim de ler e detectar qualquer pensamento penal
ocorrendo dentro da mente de um criminoso.
Referências
Bibliográficas
AGAMBEN, Giorgio. O que resta de Auschwitz. São Paulo: Boitempo, 2008.
ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo: Anti-Semitismo, Imperialismo, Totalitarismo.
São Paulo: Companhia das Letras, 1989.
CANETTI, Elias. Massa e Poder. São Paulo: Martins Fontes, 2005.
FOUCAULT, Michel. A Vontade de Saber. Rio de Janeiro: Graal, 1988.
_______ Segurança, Território, População. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
MOTT,
Luiz. Abuso sexual ritualístico. In: AZEVEDO, Maria Amélia; GUERRA, Viviane Nogueira
de Azevedo. Infância e violência doméstica: fronteiras do conhecimento.
São Paulo: Cortez, 1993.
SILVA,
Marcio Renato Pinheiro da. O filho
pródigo de São Lucas, de Gide e de Dalton Trevisan. Ipotesi
- Juiz de Fora - v.7 - n.2 - pag 135-148 – jul./dez. – 2003
ZIZEK,
Slavoj. A Visão em Paralaxe. São Paulo: Boitempo, 2008.
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